Apesar
da onda de violência ter sido contida, o Complexo Penitenciário de Pedrinhas,
no Maranhão, permanece superlotado e com relatos de tortura, segundo relatório
divulgado hoje (1º) pela organização não governamental (ONG) Conectas.
“Dois anos depois desse ponto de inflexão na história de
Pedrinhas, é possível dizer que os assassinatos diminuíram, mas o quadro de
tortura e maus-tratos generalizado se mantém”, diz o documento, elaborado a
partir de seis visitas ao longo de 2014 e 2015.
Entre janeiro de 2013 e o início
de 2014, foram registradas 63 mortes no presídio, o que trouxe repercussão para
a situação no local. O governo federal chegou a enviar a Força Nacional para
ajudar o governo maranhense a conter a onda de violência. Em 2015, foram
registradas quatro mortes violentas.
Porém, de
acordo com o relatório, as medidas adotadas pelo governo estadual ajudaram a
diminuir a violência praticada pelos próprios detentos, mas abriram espaço para
violações que partem dos agentes que fazem a segurança do complexo. “Se as
ações e omissões do Estado antes contribuíam com a violência generalizada entre
as facções rivais, hoje esse mesmo Estado é o principal artífice dessa
violência perpetrada diariamente por seus representantes – diretores de unidades
e agentes de segurança públicos e privados”, enfatiza o estudo.
Entre os
abusos encontrados pela equipe da ONG está o uso excessivo de força pelos
carcereiros, com utilização de balas de borracha e spray de pimenta.
“Servidores de segurança terceirizados, muitas vezes em condições precárias de
contratação, patrulham os pavilhões e corredores e reagem com violência a
qualquer queixa dos internos. Muitos deles cobrem o rosto com uma espécie de
touca ninja, contrariando portaria estadual (563/2015), que proíbe máscaras ou
outros acessórios que dificultem a identificação do agente”.
Para a
diretora-executiva da Conectas, Jéssica Morris, a terceirização dos serviços de
segurança penitenciária dificulta o controle e a responsabilização dos agentes.
“Se é uma empresa privada que está garantindo a segurança, então a
responsabilização não fica mais para o Estado. O Estado não tem como garantir a
aplicação efetiva das suas normas”,ressaltou.
A redução
do número de mortes não representou, na avaliação de Jéssica, uma melhora em
outros aspectos problemáticos do presídio. O complexo ainda opera com um
excedente de 55% da capacidade, com 3 mil presos em um espaço que deveria
abrigar até 1.945 pessoas. Sendo que 60% dos detentos ainda não foram
julgados.“A política do Estado, tanto federal, quanto do governo maranhense, é
muito paliativa. As medidas são insatisfatórias. Nós continuamos vendo a falta
de higiene e de acesso à saúde. Presos que não tem acesso a medicamentos. Não
tem profissionais de saúde competentes. São 12 defensores para um complexo de 3
mil presos”, criticou a diretora da ONG.
Crime organizado
Segundo o
presidente da Sociedade Maranhense de Direitos Humanos, Wagner Cabral, a
própria redução do número de assassinatos está ligada a uma política de conciliação
com o crime organizado. O relatório denuncia a divisão das alas do complexo por
facções criminosas, como forma de evitar conflitos entre os grupos. Desse modo,
de acordo com Cabral, os presos são forçados a aderir a uma das organizações
que atuam dentro da cadeia.
“Significa
que o Estado reconhece que essas facções têm o domínio real do sistema
[penitenciário]. E colocam o Estado, de maneira indireta, como principal
indutor do recrutamento das facções criminosas”, denuncia o ativista sobre o
sistema adotado informalmente em Pedrinhas. “Nós ouvimos vários presos dizendo
que não foi o Estado que resolveu a questão e, sim, os próprios presos que
entraram em um acordo de não matarem uns aos outros”, acrescentou Jéssica.
Cabral
alerta que essa associação tem graves consequências para os envolvidos e suas
famílias. “O sistema de pertencimento à facção significa um comprometimento seu
e da sua família. Significa contribuições mensais, sistema de alianças, uma
lógica de favores. Significa que, quando você sair do sistema, você tem de
fazer uma série de ações para pagar à facção criminosa”, enumerou.
Esse
recrutamento dentro da prisão é apontado pelo ativista como um dos fatores do
crescimento dos crimes no estado, especialmente na região metropolitana de São
Luís. “O Maranhão tem sido assolado pelo que se chama de Novo Cangaço, que são
as explosões de bancos no interior. Assaltos a ônibus. Todos os dados de
assaltos à mão armada na região metropolitana explodiram, porque você tem um
sistema de recrutamento massivo”.
Versão do governo
O governo
do Maranhão divulgou nota em resposta ao relatório da Conectas. Nela, ele diz
que, nos 14 meses de gestão, tem pautado as ações no sistema prisional pela
aplicação da Lei de Execuções Penais.
“Em
números reais, a gestão fechou o primeiro ano de governo com uma expressiva
diminuição no número de homicídios (-76,47%) e fugas (-72,16%) no Complexo
Penitenciário de Pedrinhas, ao cumprir, entre outras providências, a separação
de presos em prol de sua integridade física”, ressalta o comunicado.
Ainda
sobre os resultados, o governo ressalta que se passou um ano sem nenhum
registro de motins ou rebeliões no complexo, “antes corriqueiros no ambiente
carcerário maranhense; e exatos nove meses sem nenhum homicídio intramuros,
resultado este que reafirma a aplicação de boas práticas na atual gestão de
governo”, acrescenta o comunicado.
Outra
medida destacada pelo governo do Maranhão foi a inserção de 1,4 mil presos em
cursos e oficinas de preparação para o mercado de trabalho, além da reforma do
Complexo de Pedrinhas e a abertura de novas vagas no sistema prisional no
interior do estado. “Até o momento, já foram abertas 924 novas vagas no sistema
prisional maranhense com a entrega dos presídios de Balsas, Açailândia,
Imperatriz e Pinheiro. Outras 880 serão entregues em 2016”.

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