Endividados e em crise financeira, os governos estaduais gastam pelo
menos R$ 35,8 milhões por ano com o pagamento de pensões a ex-governadores e
dependentes deles. Os pagamentos são legais, mas tramitam na Justiça várias
ações que questionam essas pensões – no último dia 15, a Justiça da Bahia
suspendeu por liminar (decisão provisória) o pagamento de pensão vitalícia a
ex-governadores.
Levantamento do G1 encontrou 16 estados que pagam esses benefícios. O
gasto mensal é de R$ 2,98 milhões. Algumas dessas pensões são pagas inclusive a
quem ocupou o cargo por poucos meses ou poucos dias.
Para chegar a esse resultado, o G1 pediu a todos os governos de estados
e do Distrito Federal a relação de ex-governadores e dependentes que recebem
pensão e dos valores pagos a eles. Somente o governo da Bahia não respondeu.
No Mato Grosso, até governadores interinos têm direito à pensão. Iraci
Araújo Moreira, que foi vice do ex-governador e atual ministro da Agricultura,
Blairo Maggi, recebe mensalmente R$ 15.083,79 (em valores brutos), todos os
meses. Ela assumiu o cargo por alguns dias, durante as viagens internacionais
de Maggi.
Maria Valquíria dos Santos Cruz herdou uma pensão de R$ 15.083,79
mensais. Ela é viúva de Evaristo Roberto Vieira da Cruz, que foi presidente da
Assembleia Legislativa do Mato Grosso e ganhou direito ao benefício porque
exerceu o cargo de governador por 16 dias.
Leonel Arcângelo Pavan ocupou a cadeira de governador de Santa Catarina
entre 25 de março e 31 de dezembro de 2010, o que lhe deu direito a uma pensão
mensal de R$ 23.880,16. Ele era vice de Luiz Henrique da Silveira, que deixou o
cargo para concorrer ao Senado.
O Paraná também coleciona casos de ex-governadores que ocuparam o cargo
por poucos meses e conseguiram direito à pensão vitalícia. Uma das pensões, de
R$ 30.471,11 mensais, é paga a Madalena Gemieski Mansur, viúva de João Mansur,
que ficou um pouco mais de um mês no cargo.
O Pará paga a maior pensão encontrada no levantamento do G1: R$
48.753,78 mensais, ao ex-governador Aurélio Correa do Carmo.
A lista de quem recebe pensão como ex-governador inclui também políticos
investigados e até condenados.
É o caso do ex-governador e ex-senador mineiro Eduardo Azeredo,
condenado a 20 anos e 10 meses de prisão em 2015 pelo chamado mensalão tucano.
O ex-governador Pedro Pedrossian, governador do Mato Grosso e do Mato
Grosso do Sul, recebe duas pensões, uma de cada estado: R$ 24.117,64 e R$
30.471,11, respectivamente, num total de R$ 54.588,75 por mês.
O Congresso já começou a discussão
sobre a proposta de reforma da Previdência enviada pelo presidente Michel
Temer. A principal mudança prevista é que homens e mulheres só terão direito à
aposentadoria pelo INSS a partir dos 65 anos.
A proposta também prevê que os
trabalhadores precisarão contribuir para o INSS por 49 anos para ter direito à
aposentadoria integral, ou seja, equivalente ao salário. Esse valor, porém, tem
um teto, que hoje é de R$ R$ 5.531,31, bem mais baixo que a maior parte das
pensões pagas a ex-governadores e suas viúvas.
O
levantamento do G1 mostra que pelo menos 16
estados brasileiros pagam pensão vitalícia: Rio Grande do Sul, Santa Catarina,
Paraná, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Sergipe, Paraíba, Rio Grande do Norte,
Maranhão, Piauí, Pará, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Amazonas, Acre e
Rondônia.
Procurado
pelo G1, o governo da Bahia não respondeu aos pedidos de
informações sobre pagamento de pensões. Entretanto, no último dia 15, uma
liminar (decisão provisória) da Justiça suspendeu o pagamento de pensões a
ex-governadores do estado.
O governo de Sergipe informou o valor
das pensões pagas a viúvas, mas não divulgou o nome delas. O Piauí, que paga
pensão a seis ex-governadores e dois dependentes, não informou os nomes deles.
Quem
recebe?
Ao todo, 76 ex-governadores recebem
pensão dos estados citados. Desses, 18 acumulam o benefício com aposentadoria
de deputado ou senador e chegam a ganhar mais de R$ 50 mil por mês.
Há ainda outros 55 dependentes de
políticos, a maioria viúvas, que recebem pensão dos estados. Dezoito desses
dependentes também acumulam pensões do Congresso.
O levantamento do G1 encontrou ainda
12 políticos que exercem atualmente mandato de senador ou deputado federal e
que acumulam salário de congressista e pensão como ex-governador.
Considerando apenas ex-governadores
(ou seja, sem contar viúvas), a menor pensão encontrada no levantamento é de R$
10,5 mil mensais, paga a Francelino Pereira dos Santos e Eduardo Azeredo, que
governaram Minas Gerais.
O estado com a maior despesa é o Maranhão:
R$ 4,38 milhões por ano. Em segundo lugar está o Rio Grande do Sul, com um
gasto de R$ 4 milhões ao ano. O Rio Grande do Sul é um dos estados com situação
financeira grave e que negocia um socorro do governo federal.
O Rio de Janeiro, estado com a pior
situação fiscal do país e que vem atrasando salários de servidores e pagamento
a fornecedores, gasta mais de R$ 2 milhões por ano com as pensões.
Supremo
A discussão sobre a legalidade do
pagamento de pensões está no Supremo Tribunal Federal (STF), que já suspendeu,
por exemplo, o pagamento do benefício pelo governo do Pará.
O estado, no entanto, mantém o
pagamento das pensões, numa despesa mensal de R$ 275 mil. A assessoria do
governo informou que o jurídico estadual entende que a decisão do STF afeta apenas
o pagamento de novas pensões.
O STF analisa ações semelhantes
contra o pagamento de pensão vitalícia para ex-governadores do Acre, Paraíba,
Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Rondônia e Sergipe.
Em alguns desses estados, a pensão
não é mais garantida a novos governadores, mas continua sendo paga àqueles que
adquiriram o direito por terem deixado o cargo quando a respectiva lei ainda
estava vigente. É o caso do Piauí e do Rio Grande do Norte.
Há casos ainda, como no Paraná, em
que o governo chegou a suspender o pagamento das pensões, mas os
ex-governadores recorreram à Justiça para continuar recebendo o benefício.
Beneficiários
justificam
Por intermédio do marido, Roberto
França, a ex-vice-governadora do Mato Grosso Iraci Araújo Moreira França informou
que o recebimento da pensão é legal.
O ex-governador do Pará Aurélio
Correa do Carmo disse considerar “justa” a pensão de R$ 48,7 mil que recebe.
“Eu recebo uma pensão como ex-governador do estado, que foi aprovada pelo
Supremo [STF], pois ela é de antes da Constituição de 88”. Segundo ele, o valor
da sua pensão é maior que a de outros ex-governadores porque está somada à que
ele recebe por ser desembargador aposentado. “Então, a soma destas duas é que
chega a esse valor. Eu acho merecido o que eu recebo”, disse Carmo. “Eu não
acho injusto receber um pagamento pelo que me é devido. Eu tenho direitos
adquiridos, julgados a meu favor”, completou.
Por meio do advogado, Eduardo Azeredo
informou que “a pensão especial que me é paga pelo Governo de Minas é fruto de
decisão judicial, que a considerou justa e devida”.
O ex-governador mineiro Francelino
Pereira dos Santos, de 95 anos, informou, por meio de sua secretária, que
dedicou 55 anos à vida pública e que a lei o protege. A secretária informou
ainda que o valor que ele recebe é um pouco diferente: R$ 10.236,76. O valor da
pensão recebida por Francelino foi informado ao G1 pelo governo de Minas
Gerais.
A família do ex-governador do Mato
Grosso e do Mato Grosso do Sul Pedro Pedrossian informou que prefere “não falar
sobre esse assunto, até porque em todos os questionamentos sobre esses
pagamentos, a Justiça está dando ganho de causa a ele”.
O G1 não localizou Maria Valquiria
dos Santos Cruz, viúva do ex-governador do Mato Grosso Evaristo Roberto Vieira
da Cruz. Também não conseguiu contato com Madalena Gemieski Mansur, viúva do
ex-governador do Paraná João Mansur.
A reportagem também não obteve
resposta da assessoria do ex-governador de Santa Catarina Leonel Pavan.