POR O GLOBO
SÃO PAULO - A ex-governadora do
Maranhão, Roseana Sarney, foi denunciada pelo Ministério Público do Estado por
causar prejuízo de mais de R$ 410 milhões aos cofres públicos em esquema
fraudulento de concessão de isenções fiscais pela Secretaria de Estado da
Fazenda (Sefaz) a empresas. A acusação do MP foi no dia 21 de outubro, contra
ela e mais dez ex-gestores, servidores públicos e demais envolvidos por
práticas criminosas, e divulgada pela assessoria do órgão nesta terça-feira.
A assessoria de imprensa da
ex-governadora disse que “todos foram pegos de surpresa”, que seus advogados
ainda estão tomando conhecimento sobre a denúncia e que Roseana está tranquila.
“Em todas as decisões tomadas em benefício do Estado, a ex-governadora agiu com
respeito às leis, sempre orientada pela Procuradoria Geral do Estado do
Maranhão”, informou em nota a porta-voz de Roseana.
Na denúncia, o titular da 2ª Promotoria
de Justiça de Defesa da Ordem Tributária e Econômica de São Luís, Paulo Roberto
Barbosa Ramos, chama o grupo de organização criminosa e diz que ele realizou
compensações tributárias ilegais, implantação de filtro no sistema da
secretaria para garantir essas operações tributárias ilegais e fantasmas,
reativação de parcelamento de débitos de empresas que nunca pagavam as parcelas
devidas, exclusão indevida dos autos de infração de empresas do banco de dados
e contratação irregular de empresa especializada na prestação de serviços de
tecnologia da informação, com a finalidade de garantir a continuidade das
práticas criminosas.
“O modus operandi da organização
criminosa envolvia um esquema complexo, revestido de falsa legalidade baseada
em acordos judiciais que reconheciam a possibilidade da compensação de débitos
tributários (ICMS) com créditos não tributários (oriundos de precatórios ou
outro mecanismo que não o recolhimento de tributos). Não bastasse isso, em
diversas ocasiões, foi implantado um filtro para mascarar compensações
realizadas muito acima dos valores decorrentes de acordo homologado
judicialmente”, escreveu o promotor de justiça na denúncia.
Os demais investigados são o
ex-secretário de Estado da Fazenda, Cláudio José Trinchão Santos; o
ex-secretário de Estado da Fazenda e ex-secretário-adjunto da Administração
Tributária, Akio Valente Wakiyama; o ex-diretor da Célula de Gestão da Ação
Fiscal da Secretaria de Estado da Fazenda, Raimundo José Rodrigues do
Nascimento; o analista de sistemas Edimilson Santos Ahid Neto; o advogado Jorge
Arturo Mendoza Reque Júnior; Euda Maria Lacerda; os ex-procuradores gerais do
Estado, Marcos Alessandro Coutinho Passos Lobo e Helena Maria Cavalcanti
Haickel; e o ex-procurador adjunto do Estado do Maranhão, Ricardo Gama Pestana.
Barbosa Ramos destacou, ainda, que os
gestores do período de 14 de abril de 2009 a 31 de dezembro de 2014 ignoraram
os procedimentos administrativos característicos da administração pública ou
simplesmente deram sumiço a eles após praticarem seus crimes.
“Para consolidar a sangria dos cofres
públicos sem gerar qualquer suspeita, os secretários da Fazenda deixaram de
aprimorar o sistema de tecnologia da informação da Sefaz, permitindo aos
membros da organização criminosa reativar frequentemente parcelamento de
débitos de empresas que nunca pagavam as parcelas devidas e, ao mesmo tempo,
excluir indevidamente autos de infração do banco de dados, acarretando ainda
mais prejuízos aos cofres públicos em proveito próprio e de terceiros”, afirmou
o membro do MP.
NEBULOSO PROCESSO LICITATÓRIO
O Ministério Público destacou que o
esquema foi aperfeiçoado a partir de outubro de 2013 quando a empresa Auriga
Informática e Serviços Ltda foi formalmente substituída em “um nebuloso
processo licitatório” pela Linuxell Informática e Serviços Ltda, sendo que a
primeira continuou prestando seus serviços, por meio de aditivo contratual.
“O fato é que a Secretaria de Estado da
Fazenda pagou ao mesmo tempo duas empresas por um mesmo serviço que até então
era executado por apenas uma”, destaca a denúncia.
O promotor de justiça aponta ainda que
alguns funcionários da terceirizada Linuxell Informática e Serviços Ltda eram,
ao mesmo tempo, comissionados da Sefaz, demonstrando “a grande ousadia da
organização criminosa, respaldada pela convicção de que todos os crimes
praticados permaneceriam impunes”.
DECISIVA APROVAÇÃO DE ROSEANA SARNEY
A organização criminosa contava com “o
decisivo beneplácito de Roseana Sarney Murad”, segundo o MP, uma vez que ela
“autorizou acordos judiciais baseados em pareceres manifestamente ilegais dos
procuradores-gerais do Estado por ela nomeados”. Roseana também teria nomeado
para cargos em comissão 26 terceirizados da Linuxell, para que desempenhassem
na Sefaz as mesmas funções para as quais estavam contratados pela empresa
Auriga.
O titular da 2ª Promotoria de Justiça
de Defesa da Ordem Tributária e Econômica apontou que Marcos Alessandro
Coutinho Passos Lobo, Helena Maria Cavalcanti Haickel e Ricardo Gama Pestana
assinaram pareceres manifestamente contrários ao art. 170 do Código Tributário
Nacional, com o único objetivo de “desviar dinheiro público, em proveito
próprio ou alheio, valendo-se da condição estratégica do cargo que ocupavam”.
Na denúncia, o MP indica ainda que
compensações de créditos não tributários por tributários não ocorriam no
Maranhão desde 2004, ano em que a Lei Estadual nº 8.152/2004 revogou a Lei
Estadual nº 7.801/2002. Portanto, entre 2004 a 2009, nenhum crédito de origem
não tributária tinha sido compensado por débito de origem tributária.
“De repente, com a chegada de Cláudio
Trinchão e Akio Valente à Sefaz essa situação mudou drasticamente. É como se
tivessem descoberto uma forma de produzir dinheiro em velocidade maior que a
Casa da Moeda. Somente de 17de abril de 2009 a 31 de dezembro de 2014, foram
efetuadas 1.913 compensações. Isso mesmo. De praticamente nenhuma em toda a
história do Maranhão, como em um passe de mágica, milhares de compensações em
série passaram a ser feitas, tudo isso sem qualquer observação aos parâmetros
legais e constitucionais e ainda utilizando-se de fraude”, afirmou Barbosa
Ramos.