Por Jailton de Carvalho
BRASÍLIA — O
procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu ao Supremo Tribunal Federal
a prisão do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), do ex-presidente
da República José Sarney (PMDB-AP) e do senador Romero Jucá (PMDB-RR). A
informação é de um interlocutor de ministros do STF. Renan, Sarney e Jucá foram
flagrados tramando contra a Operação Lava-Jato em conversas gravadas pelo
ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado. Os pedidos de prisão já estão com o
ministro Teori Zavascki, do STF, há pelo menos uma semana.
Janot também pediu o afastamento de Renan da presidência do
Senado, usando argumentos similares aos empregados no pedido de destituição de
Eduardo Cunha (PMDB-RJ) da presidência da Câmara e do mandato de deputado
federal, o que acabou sendo atendido pelo STF.
Horas
depois da revelação do GLOBO, o “Bom Dia Brasil” da TV GLOBO confirmou também o
pedido de prisão do presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha. Mas o motivo
direto do pedido não seria a tentativa de atrapalhar as investigações da
Lava-Jato, e, sim, por conta de que a decisão de Teori, em maio, de afastá-lo
da presidência da Câmara e do mandato, não surtiu efeito e o deputado continuou
interferindo no comando da Casa.
Cunha foi destituído da presidência da Câmara e do mandato de
deputado por tentar atrapalhar a Lava-Jato e por ser portador de uma longa
ficha de acusações de corrupção. Cunha foi citado como destinatário de propina
por pelo menos sete delatores. Em razão das acusações, já responde a um
processo e pelo menos quatro inquéritos no âmbito da Lava-Jato.
Os indícios de conspiração, captados nas gravações e reforçados
pelas delações de Sérgio Machado e de seu filho Expedito Machado, são
considerados por investigadores mais graves que as provas que levaram Delcídio
Amaral à prisão, em novembro do ano passado, e à perda do mandato, em maio. De
acordo com a fonte, Delcídio tentou manipular uma delação, a do ex-diretor de
Internacional da Petrobras Nestor Cerveró, enquanto Renan, Sarney e Jucá
planejavam derrubar toda a Lava-Jato.
A INFLUÊNCIA DE SARNEY
Para essa pessoa com acesso às investigações, não há dúvida de
que, se a trama não fosse documentada pelas gravações de Sérgio Machado, a
legislação seria modificada de acordo com o interesse dos investigados. Renan,
Jucá e Sarney estão entre os políticos mais influentes do Congresso. Sarney,
mesmo sem mandato, controla bancadas na Câmara e no Senado. Ele teria tido,
inclusive, papel decisivo no processo de afastamento da presidente Dilma
Rousseff. Jucá, logo depois que Michel Temer assumiu interinamente a
presidência da República, foi alçado ao cargo de ministro do Planejamento, mas
caiu após a divulgação das escutas.
Numa série de depoimentos que prestou, após firmar acordo de
delação premiada, Machado disse que distribuiu R$ 70 milhões em propina para
Renan, Sarney e Jucá, entre outros políticos do PMDB durante os 12 anos que
esteve à frente da Transpetro, como revelou O GLOBO na sexta-feira. Nas
conversas gravadas por Machado, Renan, Jucá e Sarney aparecem discutindo
medidas para interferir na Lava-Jato.
Padrinho político de Machado e alvo central da delação do
ex-presidente da Transpetro, Renan sugere mudar a lei para inibir a delação premiada.
A delação tem sido usada em quase todos os inquéritos abertos na Lava-Jato,
inclusive os instaurados contra o presidente do Senado. Mais ousado, Jucá
descreve uma articulação política dele e de outros líderes para derrubar a
presidente Dilma e, a partir daí, “estancar a sangria da Lava-Jato”.
Sarney sugere a escalação de dois advogados — Cesar Asfor Rocha,
ex-presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), e Eduardo Ferrão — para
uma conversa com Teori Zavascki, relator da Operação Lava-Jato no STF. Para a
Procuradoria-Geral da República, está claro que a ação de Renan, Jucá e Sarney
tinha como objetivo obstruir as investigações sobre a organização especializada
em desviar dinheiro de contratos entre grandes empresas e a Petrobras.
A divulgação de parte das conversas de Machado já resultaram na
demissão de Jucá do Planejamento e do consultor Fabiano Silveira, do Ministério
da Transparência, em menos de um mês de governo Temer. Agora, caberá ao STF
deliberar sobre o pedido de Janot. O pedido foi encaminhado a Teori, mas
depende de decisão do plenário do tribunal. Nos últimos dias, Teori sondou
colegas de tribunal sobre o assunto.
Esta é a primeira vez que um procurador-geral da República pede
o afastamento e a prisão de um presidente do Senado. O pedido de afastamento de
Renan foi noticiado pelo jornal “Valor Econômico” na semana passada. Caberá aos
ministros decidirem se Renan, alvo de 12 inquéritos no STF, ainda preenche os
requisitos para permanecer na presidência do Senado e na linha sucessória da
presidência da República.
PROPINA DE R$ 70 MILHÕES
Nos depoimentos da delação premiada, Machado disse que arrecadou
mais de R$ 70 milhões para Renan, Sarney e Jucá, entre outros líderes do PMDB
que davam sustentação à permanência dele na presidência da Transpetro.
Responsável pela indicação de Machado à presidência, ainda em 2003, Renan foi,
segundo o ex-presidente, destinatário de R$ 30 milhões. Jucá e Sarney teriam
recebido R$ 20 milhões cada um. Machado disse ainda que arrecadou dinheiro para
o senador Edison Lobão (PMDB-MA), ex-ministro de Minas e Energia, e para o
senador Jader Barbalho (PMDB-PA).
Depois de confessar crimes cometidos em nome dele e dos
padrinhos políticos, Machado se comprometeu com os investigadores da Lava-Jato
a devolver aproximadamente R$ 100 milhões. Parte do dinheiro era administrado
por Expedito, um dos quatro filhos dele, que vivia em Londres. As contas com o
dinheiro ilegal estão num banco na Suíça. Outros dois filhos de Machado também
fizeram delação.
Na sexta-feira passada, procurado pelo GLOBO para falar sobre a
acusação de receber dinheiro de Machado, Renan disse que apenas mantinha
relação institucional com o ex-presidente da Transpetro. Dias antes, quando as
primeiras gravações vieram à tona, o senador disse que, na conversa com
Machado, apenas expressou um ponto de vista sobre a Lava-Jato.
Também na semana passada, Jucá negou que tenha recebido qualquer
dinheiro ou autorizado alguém a receber recursos em nome dele. O advogado
Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, responsável pela defesa de Sarney,
disse, também semana passada, após o noticiário sobre as gravações, que não
poderia responder sobre fragmentos da delação. Antes de dar entrevista, ele
quer ter acesso completos ao autos.