Presidente nacional do PMDB, o vice-presidente da República, Michel Temer, enviou uma carta à presidente Dilma Rousseff nesta segunda-feira (7) na qual apontou episódios que demonstrariam a "desconfiança" que o governo tem em relação a ele e ao PMDB.
A mensagem, segundo a assessoria da
Vice-Presidência, foi enviada em "caráter pessoal" à chefe do
Executivo e, nela, ele não "não propôs rompimento" com o governo ou
entre partidos, mas defendeu a "reunificação do país".
Temer havia passado os últimos dias sem
se pronunciar sobre o acolhimento pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha
(PMDB-RJ), de pedido de abertura de processo de impeachment. Nesta
segunda-feira, ele participou de evento público em São Paulo, mas não se
manifestou sobre o caso. O PMDB, principal partido da base, está dividido em
relação ao apoio ao processo de impeachement.
Num dos trechos da carta, Temer escreve
que passou o primeiro mandato de Dilma como um "vice decorativo", que
perdeu "todo protagonismo político" que teve no passado e que só era
chamado "para resolver as votações do PMDB e as crises políticas".
Depois, lista fatos envolvendo derrotas que sofreu com atos da presidente.
Na carta, ele cita inclusive o caso de
Eliseu Padilha, ex-ministro da Aviação Civil que pediu demissão nesta
segunda-feira após dias de especulação. Na coletiva de imprensa na qual
explicou os motivos da saída do governo, Padilha mencionou, entre outros
fatores, a indicação de um técnico para o comando da Agência Nacional de
Aviação Civil, feita por ele e barrada pelo governo. Temer citou o caso na
carta.
Leia abaixo a íntegra da carta.
São Paulo, 07 de Dezembro de 2.015.
Senhora Presidente,
"Verba volant, scripta
manent" (As palavras voam, os escritos permanecem)
Por isso lhe escrevo. Muito a propósito
do intenso noticiário destes últimos dias e de tudo que me chega aos ouvidos
das conversas no Palácio.
Esta é uma carta pessoal. É um desabafo
que já deveria ter feito há muito tempo.
Desde logo lhe digo que não é preciso
alardear publicamente a necessidade da minha lealdade. Tenho-a revelado ao
longo destes cinco anos.
Lealdade institucional pautada pelo
art. 79 da Constituição Federal. Sei quais são as funções do Vice. À minha
natural discrição conectei aquela derivada daquele dispositivo constitucional.
Entretanto, sempre tive ciência da
absoluta desconfiança da senhora e do seu entorno em relação a mim e ao PMDB.
Desconfiança incompatível com o que fizemos para manter o apoio pessoal e
partidário ao seu governo.
Basta ressaltar que na última convenção
apenas 59,9% votaram pela aliança. E só o fizeram, ouso registrar, por que era
eu o candidato à reeleição à Vice.
Tenho mantido a unidade do PMDB
apoiando seu governo usando o prestígio político que tenho advindo da
credibilidade e do respeito que granjeei no partido. Isso tudo não gerou
confiança em mim, Gera desconfiança e menosprezo do governo.
Vamos aos fatos. Exemplifico alguns
deles.
1. Passei os quatro primeiros anos de
governo como vice decorativo. A Senhora sabe disso. Perdi todo protagonismo
político que tivera no passado e que poderia ter sido usado pelo governo. Só
era chamado para resolver as votações do PMDB e as crises políticas.
2. Jamais eu ou o PMDB fomos chamados
para discutir formulações econômicas ou políticas do país; éramos meros
acessórios, secundários, subsidiários.
3. A senhora, no segundo mandato, à
última hora, não renovou o Ministério da Aviação Civil onde o Moreira Franco
fez belíssimo trabalho elogiado durante a Copa do Mundo. Sabia que ele era uma
indicação minha. Quis, portanto, desvalorizar-me. Cheguei a registrar este fato
no dia seguinte, ao telefone.
4. No episódio Eliseu Padilha, mais
recente, ele deixou o Ministério em razão de muitas "desfeitas",
culminando com o que o governo fez a ele, Ministro, retirando sem nenhum aviso
prévio, nome com perfil técnico que ele, Ministro da área, indicara para a
ANAC. Alardeou-se a) que fora retaliação a mim; b) que ele saiu porque faz
parte de uma suposta "conspiração".
5. Quando a senhora fez um apelo para
que eu assumisse a coordenação política, no momento em que o governo estava
muito desprestigiado, atendi e fizemos, eu e o Padilha, aprovar o ajuste
fiscal. Tema difícil porque dizia respeito aos trabalhadores e aos empresários.
Não titubeamos. Estava em jogo o país. Quando se aprovou o ajuste, nada mais do
que fazíamos tinha sequência no governo. Os acordos assumidos no Parlamento não
foram cumpridos. Realizamos mais de 60 reuniões de lideres e bancadas ao longo
do tempo solicitando apoio com a nossa credibilidade. Fomos obrigados a deixar
aquela coordenação.
6. De qualquer forma, sou Presidente do
PMDB e a senhora resolveu ignorar-me chamando o líder Picciani e seu pai para
fazer um acordo sem nenhuma comunicação ao seu Vice e Presidente do Partido. Os
dois ministros, sabe a senhora, foram nomeados por ele. E a senhora não teve a
menor preocupação em eliminar do governo o Deputado Edinho Araújo, deputado de
São Paulo e a mim ligado.
7. Democrata que sou, converso, sim,
senhora Presidente, com a oposição. Sempre o fiz, pelos 24 anos que passei no
Parlamento. Aliás, a primeira medida provisória do ajuste foi aprovada graças
aos 8 (oito) votos do DEM, 6 (seis) do PSB e 3 do PV, recordando que foi
aprovado por apenas 22 votos. Sou criticado por isso, numa visão equivocada do
nosso sistema. E não foi sem razão que em duas oportunidades ressaltei que
deveríamos reunificar o país. O Palácio resolveu difundir e criticar.
8. Recordo, ainda, que a senhora, na
posse, manteve reunião de duas horas com o Vice Presidente Joe Biden - com quem
construí boa amizade - sem convidar-me o que gerou em seus assessores a
pergunta: o que é que houve que numa reunião com o Vice Presidente dos Estados
Unidos, o do Brasil não se faz presente? Antes, no episódio da
"espionagem" americana, quando as conversar começaram a ser
retomadas, a senhora mandava o Ministro da Justiça, para conversar com o Vice
Presidente dos Estados Unidos. Tudo isso tem significado absoluta falta de
confiança;
9. Mais recentemente, conversa nossa
(das duas maiores autoridades do país) foi divulgada e de maneira inverídica
sem nenhuma conexão com o teor da conversa.
10. Até o programa "Uma Ponte para
o Futuro", aplaudido pela sociedade, cujas propostas poderiam ser
utilizadas para recuperar a economia e resgatar a confiança foi tido como
manobra desleal.
11. PMDB tem ciência de que o governo
busca promover a sua divisão, o que já tentou no passado, sem sucesso. A
senhora sabe que, como Presidente do PMDB, devo manter cauteloso silencio com o
objetivo de procurar o que sempre fiz: a unidade partidária.
Passados estes momentos críticos, tenho
certeza de que o País terá tranquilidade para crescer e consolidar as
conquistas sociais.
Finalmente, sei que a senhora não tem
confiança em mim e no PMDB, hoje, e não terá amanhã. Lamento, mas esta é a
minha convicção.
Respeitosamente,
\ L TEMER
A Sua Excelência a Senhora
Doutora DILMA ROUSSEFF
DO. Presidente da República do Brasil
Palácio do Planalto