A Câmara gastou em bilhetes aéreos para
os deputados federais R$ 47.563.307,55 de março de 2016 até o mesmo mês deste
ano. Os dados constam do Controle Cidadão, ferramenta utilizada pela Casa para
monitorar os gastos com a Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar.
O campeão do uso para esse fim é o
deputado federal Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força (SD-SP). No
período entre março de 2016 e fevereiro deste ano, foram executados pelo
gabinete do parlamentar e principal liderança do Solidariedade R$ 289.135,67 em
passagens. No total, foram 438 passagens, o que significa que, em média, o
gabinete de Paulinho comprou 8,4 bilhetes aéreos por semana para ele e sua
equipe.
Paulinho da Força não teve gasto com
passagens aéreas lançados em março --os parlamentares têm três meses de prazo
para prestar contas.
Desse total, houve reembolso de R$
24.286,24 de passagens não utilizadas. Entre as regras da cota parlamentar,
está a de que as passagens não usadas pelos gabinetes dos parlamentares terão
seu valor devolvido para a Câmara. Dessa forma, o total utilizado foi de R$
264.849,43.
Segundo nota emitida pelo gabinete do
deputado, "trata-se da atividade parlamentar normal". "As
viagens são necessárias para o cumprimento de agendas, presenças em comissões e
contatos políticos e administrativos. Tudo se deu dentro das atribuições do
mandato popular, das regras da Câmara dos Deputados e da legislação
vigente."
168 bilhetes para secretário
parlamentar
Nove pessoas do gabinete de Paulinho
utilizaram o recurso, todos secretários parlamentares, alguns já exonerados,
como Marco Antonio da Rocha, eleito vereador em Espírito Santo do Pinhal (SP)
em outubro de 2016 pelo PMDB --ele utilizou a passagem quando ainda trabalhava
para Paulinho.
Segundo nota enviada pela equipe do
deputado, "os funcionários pertencem ao gabinete do mandato parlamentar,
cumprem funções de representação e têm o direito de utilizar as passagens. As
viagens são legais e obedecem a todas as regras da Câmara dos Deputados".
No período, foram feitas 438 emissões
de passagens para o gabinete, sem contar as devoluções do dinheiro de bilhetes
não utilizados e os custos com serviços das companhias, como assento conforto e
remarcação de horário. O maior utilizador do dinheiro da cota é seu secretário
parlamentar Marcelo Cavalcanti --foram 168 emissões, ao custo de R$ 115.793,59.
Já o deputado utilizou 140 bilhetes, ao custo de R$ 75.643,85.
De acordo com o gabinete, Cavalcanti é
chefe de gabinete. "É a pessoa que melhor representa o deputado e, assim,
também é o mais solicitado. Isso explica o número de viagens, que sempre
seguiram as regras da Câmara dos Deputados, sem jamais ferir qualquer
regulamento ou legislação vigentes", diz a nota.
Outros dois assessores aparecem com
número alto de bilhetes: André Sá, com 82 passagens e gasto de R$ 36.746,94, e
Fábio Vieira, com 34 bilhetes por R$ 19.970,02.
Em um voo ida e volta São
Paulo-Brasília, entre 5 e 6 de abril de 2016, o gabinete de Paulinho gastou com
seis pessoas diferentes de seu gabinete. Gildázio Costa, Flávio Luciano da
Silva, Fábio Miranda, Ronaldo Peres e os já citados Marco Antonio da Rocha,
Fábio Vieira e André Sá constam nos trechos.
"Penduricalhos"
O ato 43/2009 da Câmara, que
regulamenta a Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar, permite que
funcionários do gabinete utilizem as passagens dos deputados, sem limite de
pessoas. Não é, no entanto, usual que tantos secretários parlamentares façam uso
do serviço.
"Esses penduricalhos surgiram em
uma época que os deputados reclamaram que o salário estava muito baixo. Essas
verbas foram aumentadas de forma generosa: os salários não foram aumentados,
mas essas verbas passaram despercebidas", afirma o secretário-geral da ONG
Contas Abertas, Gil Castello Castello Branco, lembrando o surgimento das cotas,
em 2001 --oito anos depois, elas seriam regulamentadas pelo Ato 43/2009 da
Câmara.
"A todos esses custos, sucederam
denúncias sobre o mau uso. O deputado fica com o salário [de R$ 33.763] no
topo, no nível de outros Poderes, mas com essa cota para gastar. Parlamentares
que abriram mão dessa verba desempenham seu papel da mesma
maneira."
O deputado fica com o salário [de R$
33.763] no topo, no nível de outros poderes, mas com essa cota para gastar.
Parlamentares que abriram mão dessa verba desempenham seu papel da mesma
maneira.
A cota parlamentar varia conforme a
distância aérea e o preço da passagem. Para os deputados baianos, o valor é de
R$ 39.010,85. Um parlamentar de Roraima, por exemplo, pode gastar até R$
45.612,53 por mês --no Distrito Federal, em que não há necessidade de voo para
o Estado de origem, esse dinheiro é de R$ 30.788,66. Como a verba mensal pode
ser acumulada, é possível que existam estouros mensais no uso dessa cota, mas
não anuais. No caso de Paulinho, ela é de 33.730,95.
De Boa Vista a Curitiba
O uso de bilhetes aéreos tem como
função principal o diálogo do deputado federal com o seu domicílio eleitoral.
Paulinho utilizou a maior parte dessas passagens no trecho entre sua base, São
Paulo, e Brasília. Foram 178 voos só ida partindo de Congonhas para Brasília, e
182 fazendo o trajeto oposto. Em nove vezes, o gabinete do deputado usou um
bilhete para o trecho completo ida e volta. São também 36 voos partindo de
Brasília para Guarulhos, quatro de Cumbica para a capital federal e um do
aeroporto de Viracopos, em Campinas (SP). Cavalcanti, chefe de gabinete de
Paulinho, também utilizou uma das passagens da cota para voar de Brasília até
Presidente Prudente, no interior de São Paulo.
Há, no entanto, uma série de bilhetes
para localidades distantes da base paulista. O trecho completo
Teresina-Brasília-Teresina foi usado quatro vezes pelo assessor Marcelo
Cavalcanti. Também há viagens para Cuiabá (três bilhetes), Boa Vista (dois),
Curitiba (dois saindo de Brasília, outros dois voltando para São Paulo), além
de uma emissão de ida e volta para a ponte aérea Rio-São Paulo.
Segundo nota oficial do deputado,
"a atividade de um deputado federal muitas vezes extrapola seu Estado de
origem, em razão de convites e solicitações para a representação do
parlamentar". "Como líder trabalhista no Congresso, é produtivo e
natural que o deputado participe de atividades em outros Estados além de São
Paulo."
Marcos Sergio Silva
Do UOL, em São Paulo